Indígenas começam a retornar ao
local onde ocorreu o massacre, que resultou na morte do cacique Nísio
Gomes; quatro pessoas estão desaparecidas
Os
indígenas Guarani Kaiowá do acampamento Tekoha Guaiviry, entre os
municípios de Amambaí e Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul (MS), começam
a retornar ao local após o ataque que sofreram na última sexta-feira
(18).
Eles
seguem a orientação do cacique Nísio Gomes, 59 anos, executado com
tiros de calibre 12 por cerca de 40 pistoleiros fortemente armados que
invadiram o acampamento. Antes de cair inconsciente, o cacique pediu aos
indígenas que não desistissem da luta que travam por seu território
tradicional. “Vocês não deixem esse lugar. Cuidem com coragem dessa
terra. Essa terra é nossa. Ninguém vai tirar vocês...Cuidem bem de
minha neta e de todas as crianças. Essa terra deixo na tua mão.
Guaiviry já é terra Indígena”, disse o cacique, segundo divulgado pelo
conselho da Aty Guasu, movimento político guarani kaiowá.
Durante
o ataque, os indígenas correram para a mata e chegaram aos municípios
de Amambai e Ponta Porã. Alguns deles chegaram a prestar depoimento na
Delegacia da Polícia Federal em Ponta Porã e disseram que, além do
cacique, pelo menos outras três pessoas foram atingidas pelos
pistoleiros. Sete mulheres indígenas contaram que três jovens – J.V, 14
anos, M.M, 15 anos, e J.B, 16 anos – foram baleados, sendo que um
encontra-se hospitalizado e os outros dois desaparecidos.
Ainda
não se tem o número exato de vítimas, justamente porque a comunidade
se dispersou para a mata para se proteger do ataque. O Ministério
Público Federal (MPF) recebeu informações, ainda não confirmadas, de que
uma mulher e uma criança também teriam sido baleadas. Além da munição
convencional, os pistoleiros usaram balas de borracha contra os
indígenas, deixando muitos feridos.
De
acordo com os relatos das testemunhas, o massacre tinha como alvo o
cacique. Depois de morto, o corpo de Nísio Gomes foi levado pelos
pistoleiros em uma das caminhonetes usadas durante o ataque – prática
vista em outros massacres cometidos contra os Guarani Kaiowá no MS.
“Estavam
todos de máscaras, com jaquetas escuras. Chegaram ao acampamento e
pediram para todos irem para o chão. Portavam armas calibre 12”, disse
um indígena da comunidade que presenciou o ataque e terá sua identidade
preservada por motivos de segurança.
“Chegaram
para matar nosso cacique”, afirmou. O filho de Nísio tentou impedir o
assassinato do pai, segundo o indígena, e se atirou sobre um dos
pistoleiros. Bateram no rapaz, mas ele não desistiu. Só o pararam com um
tiro de borracha no peito.
A
Polícia Federal, integrantes da Articulação dos Povos Indígenas do
Brasil (Apib) e do conselho Aty Guassu (Grande Assembleia Guarani),
Fundação Nacional do Índio (Funai) e MPF estiveram no acampamento. Em
nota, o MPF afirma que abriu investigação e na perícia constatou marcas
de sangue que remontam a cena de um corpo sendo arrastado,
possivelmente o do cacique Nísio Gomes.
Luta pela terra
Os
indígenas ocupam desde o dia 1º deste mês a terra localizada entre as
fazendas Chimarrão, Querência Nativa e Ouro Verde – instaladas em
Território Indígena de ocupação tradicional dos Kaiowá. Antes, a
comunidade vivia na beira de uma Rodovia Estadual.
A
área ocupada pela comunidade está em processo de identificação desde
2008 e em fase de conclusão do relatório pela Funai. Há aínda um Termo
de Ajustamento de Conduta (TAC) do Ministério Público Federal (MPF) em
execução, referente ao processo de demarcação da Terra Indígena. Por
conta disso, o ataque tem como principal causa o conflito pela posse do
território. A região do ataque fica a meia hora da fronteira com o
Paraguai.
Conforme
recente publicação do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) sobre a
violência praticada contra os povos indígenas do MS nos últimos oito
anos, no estado está concentrada a maior quantidade de acampamentos
indígenas do país, 31 - há dois anos, em 2009, eram 22.
São
mais de 1200 famílias vivendo em condições degradantes à beira de
rodovias ou sitiadas em fazendas. Expostas a violências diversas, as
comunidades veem suas crianças sofrerem com a desnutrição – os casos
somam 4 mil nos últimos oito anos - e longe do território tradicional.
Atualmente,
98% da população originária do estado vivem efetivamente em menos de
75 mil hectares, ou seja, 0,2% do território estadual. Em dados
comparativos, cerca de 70 mil cabeças de gado, das mais de 22,3 milhões
que o estado possui, ocupam área equivalente as que estão efetivamente
na posse dos indígenas hoje.
Em
nota, o Cimi responsabilizou a presidenta da República, Dilma
Rousseff, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, o presidente da
Funai, Márcio Meira e o governador do Mato Grosso do Sul, André
Puccinelli pela chacina praticada contra a comunidade Guarani Kaiowá.
“O
Poder Executivo tem sido omisso, negligente e subserviente. Com isso,
promove e legitima as práticas de violências. O ministro da Justiça
recebe latifundiários, mas não cobra Márcio Meira, presidente da Funai,
sobre o andamento do processo de identificação e demarcação das terras
indígenas que desde 2008 caminha de forma lenta – enquanto a morte
chega cada vez mais rápida aos acampamentos indígenas. ”, afirma a nota
do Cimi.
Fonte: Brasil de Fato
Nenhum comentário:
Postar um comentário
DEIXE SEU COMENTÁRIO PARA ESTA NOTÍCIA